A saga do Urso… ou: Como a miopia organizacional pode acabar com um empreendimento

A saga do Urso… ou: Como a miopia organizacional pode acabar com um empreendimento

Certa vez eu li um livro (Era Urso?)  infanto-juvenil muito interessante a respeito de um Urso (isto mesmo, um Urso, não se tratava de um homem feio ou peludo, mas, sim, de um mamífero carnívoro da família dos Ursídeos). Gostei muito da história e dos seus desdobramentos, especialmente porque todo o enredo se passava em uma empresa… humana, é claro, (nesse caso, sim, com homens feios e peludos) e permeava toda a estrutura hierárquica.

Bem, comecei a usar a historinha nos meus treinamentos comportamentais e de liderança. Um sucesso! O mais interessante era que toda vez que eu aplicava a narrativa e pedia uma analogia com a realidade de uma empresa eu ficava surpreso com os considerandos, exemplos, concordâncias e discordâncias dos participantes. Era fantástico ver toda aquela fartura participativa. Algumas pessoas achavam que o Urso se fazia de ingênuo para aproveitar convenientemente da situação; outras defendiam a ideia de que toda a linha hierárquica da empresa era míope; havia os que criticavam a ambos: Urso e empresa, e também os que achavam que todo aquele contexto era a representação exata do que acontecia numa empresa autocrática.

Vou resumir a historinha para você se inteirar do que se passou com o Urso:

Um urso gostava muito de passear pela floresta. Um dia ele olhou para o céu e viu um bando de gansos voando para as zonas mais quentes. As folhas das árvores haviam amarelecido e começavam a cair. O urso sabia que o inverno estava chegando e ele precisava arranjar uma toca para se esconder. E foi exatamente o que ele fez.

Dias depois, dezenas de homens entraram na floresta, carregando mapas enormes, binóculos e estranhos aparelhos. Depois chegaram outros homens, traziam pás, tratores e serras elétricas, derrubaram árvores, cavaram buracos, trabalharam bastante. Mudaram tudo de lugar. Quem ali chegasse não reconheceria a antiga floresta. Uma grande fábrica foi construída em cima da toca onde e o urso dormia. As chaminés atravessavam a neve e soltavam fumaça para todos os lados.

E então chegou a primavera.

O urso acordou, espreguiçou-se, coçou o nariz e bocejou. Olhou em volta, a escuridão era grande, ele não podia ver quase nada. Lá adiante, o urso viu uma luz, subiu os degraus, chegou à porta da toca e parou de repente. O que era aquilo? Onde estavam as árvores? Cadê os pássaros? E as flores? O que havia acontecido? Ele não estava compreendendo nada. O que eram aqueles enormes edifícios? E aquelas chaminés soltando fumaça?

Um vigia aproximou-se e perguntou o que ele estava fazendo no pátio. Mandou-o trabalhar. Trabalhar? Sou apenas um urso. Olhe aqui! Ou você vai trabalhar agora mesmo, ou eu chamo o chefe. Troque de roupa, tome banho, faça a barba e vá trabalhar. Não quero gente suja aqui na fábrica.

E levou o urso à sala do chefe. O urso continuou insistindo que era apenas um urso. E o chefe ordenou: troque de roupa, faça a barba, tome banho e vá trabalhar.

E foi levado ao gabinete do gerente. Deixe de conversa mole. Vá tomar banho, faça a barba e troque de roupa. Precisamos de você lá embaixo, na fábrica. Mas eu sou um urso…

Na sala do diretor as secretárias olharam com espanto para o urso. O diretor levantou-se e apontou para ele: – Basta de brincadeira. Vá trabalhar que é melhor. Troque de roupa, faça a barba, tome banho e pare com essa mania de querer passar por urso.

O vice-presidente já sabia da história do urso e estava furioso: – Você não é urso coisa nenhuma. Vou levá-lo ao presidente.

A sala do presidente era muito bonita. Havia cortinas nas janelas e quadros pendurados nas paredes. Atrás do urso, entraram na sala o vigia, o chefe, o gerente, o diretor e o vice-presidente. O urso apontou para trás: – Eu não queria vir, mas eles me trouxeram. Juro que sou um urso. O presidente sorriu: – Calma meu filho. Você está muito nervoso. Não precisa esconder nada. Sei que você não é um urso. Faça a barba, tome um banho, troque de roupa e vá trabalhar. – Mas eu sou um urso!

O presidente fechou a cara: – Deixe de bobagem. Você não é urso coisa nenhuma. E eu posso provar. Os ursos vivem nos circos e zoológicos, não vivem? Pois, então? Entraram todos no carro do presidente e foram ao jardim zoológico. Quando chegaram perto da jaula dos ursos, o presidente apontou para o urso e perguntou: – Ele é um urso ou não? Um urso que estava dentro da jaula respondeu: – Claro que não. Se ele fosse urso estaria aqui dentro, com a gente. O urso reclamou: – Mas eu sou um urso! Então, um filhote de urso aproximou-se das grades e gritou: – Você precisa é de um banho. Troque de roupa e vá trabalhar, vagabundo!

E puseram o urso a trabalhar numa grande máquina, ao lado dos operários. E vários meses se passaram…

Mas um dia a fábrica fechou. Os operários foram para casa. O urso não tinha casa, mulher, nem filhos, e não sabia para onde ir. Caminhou horas e horas sem destino, até se cansar. Olhou então, para o céu. E viu um bando de gansos voando para os trópicos. As folhas das árvores começavam a cair. Lá adiante havia um buraco entre as raízes de uma grossa árvore. O urso pensou em esconder-se por lá. Mas quando chegou perto pensou: “Eu não posso entrar nessa toca. Não sou um urso. Sou apenas um homem preguiçoso, que precisa tomar banho, fazer a barba e trocar de roupa”.

Veio o inverno. A neve cobriu tudo. A floresta desapareceu embaixo dos flocos brancos. O urso tremia de frio. “Se eu fosse um urso…”, pensou. A neve começou a virar gelo. O urso ficou triste. Sozinho no meio da neve e do gelo, ele se lembrou com saudade do tempo em que trabalhava na fábrica: “Como era bom lá dentro… tudo tão quentinho…”

Deitou-se outra vez de costas, cochilou, dormiu e sonhou… que era um urso.

Então, que analogia você faz? O Urso poderia ter revelado a sua verdadeira identidade de…Urso? Por que não o fez? O sistema tolheu (ou tolhe), inclusive, a nossa verdadeira espécime? Por que a fábrica fechou? Foi pela miopia de todos, que não souberam diferenciar uma situação real de uma fictícia? Ou ninguém teve coragem para contrapor as opiniões, mesmo falsas, na escala hierárquica? (lembra-se da fábula: a roupa nova do imperador? – apenas uma criança teve a coragem, ou a verdadeira inocência, de revelar aquilo que todos sabiam, mas que se calaram por medo: o imperador está nu).

Pense nisto! Você pode estar sendo o Urso desta historinha… na sua historia de vida, e poderá até ser confundido com um deles (nesse caso, faça a barba, tome….) ou, ainda, você é míope (por conveniência ou não) em relação à realidade dos fatos. Reaja! Ao contrário do Urso, mostre quem você é, de fato.

Contudo, eu estou convencido de que as empresas modernas e competitivas (ao menos as que eu conheço) pensam muito diferente deste enredo. Elas procuram ir muito além do óbvio. Ainda bem! Urrrrrrrrrrrrrrgh

AUTOR: CARLOS MINA – consultor, palestrante e escritor (imprima e divulgue, se desejar, mas não omita a fonte).

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